A importância do homem pantaneiro na formatação de uma legislação específica para disciplinar a proteção e uso sustentável do Bioma do Pantanal, ficou evidenciada na tarde de ontem, sexta-feira, 25, durante audiência pública que lotou o plenário da Câmara Municipal de Vereadores de Corumbá.
O evento, uma iniciativa do vereador Chicão Vianna e referendada pelos demais pares do Poder Legislativo, reuniu pessoas ligadas aos segmentos da cadeia produtiva pantaneira, como pecuária, turismo, pesca e mineração, além de Organizações Não Governamentais (ONGs), entidades de classe, pesquisadores, prefeitos, vice-prefeito, representantes do Governo do Estado, entre outros.
“Foi extremamente importante. Tivemos a oportunidade de debater questões fundamentais para que o Bioma Pantanal continue forte, preservado, conservado, gerando emprego, renda e incrementando a economia das cidades pantaneiras, do Mato Grosso do Sul e do Brasil”, afirmou Chicão.
“Estamos agora trabalhando na formatação de um documento final que será encaminhado ao Governo do Estado e aos nossos parlamentares estaduais e federais, que servirá para enriquecer a Lei Estadual já anunciada pelo governador Eduardo Riedel, bem como uma futura Lei Federal”, ressaltou o vereador.
Chicão entendeu a angústia dos pantaneiros, os pecuaristas locais, e que essas legislações não venham prejudicar a economia pantaneira, a economia local, que é essencial, histórica e muito mobilizada. “Todos estão preocupados e o sentido disso é buscar uma legislação equilibrada para a preservação como sempre foi feito”, continuou.
Chicão lembrou que a audiência foi pensada a partir do momento em que tomou conhecimento de um Projeto de Lei que estava sendo elaborado pela deputada federal Camila Jara, que dispunha sobre a conservação, a proteção, a restauração e a exploração sustentável do bioma pantanal, alterando a Lei 9.985/200, que instituiu o Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza.
“Não sou contra, muito pelo contrário. Mas, o problema foi que alguns trechos resultaria em sérios problemas para o homem pantaneiro, com reflexos negativos na pecuária e mineração, principalmente, o que geraria sensível queda na geração de renda e emprego, afetando diretamente a economia das cidades pantaneiras”, explicou.
OUVIR O PANTANEIRO
Por isso mesmo a audiência foi proposta e foi considerada de extrema importância. Depoimentos de representantes dos mais diferentes segmentos, mostraram que o homem pantaneiro sabe, como ninguém, preservar, conservar o ambiente.
Todos foram unânimes em destacar que aproximadamente 90 milhões de quilômetros quadrados do Bioma Pantanal está no Mato Grosso do Sul, e que desse total, 85% estão preservados, coberto por vegetação nativa, que se divide em áreas florestais, savanas, campos alagáveis e brejos.
E o responsável por tudo isso é o homem pantaneiro como o pecuarista que que está na região há mais de 200 anos. Só em Corumbá são 2.134 propriedades rurais responsável por um rebanho em torno de 1,8 milhão de cabeça, o segundo maior rebanho do país, gerando renda e emprego para cerca de 15 mil pessoas, e alimento para milhares de brasileiros e até do exterior.
Outras cidades pantaneiras estão no mesmo patamar. Juntas Corumbá, Ladário, Porto Murtinho, Miranda, Aquidauana, Rio Verde e Coxim, contam com 3.527 propriedades rurais e um rebanho bovino de mais de 3,8 milhões de cabeças.
O prefeito de Aquidauana, Odilon Ribeiro, foi taxativo ao afirmar que o homem da terra sabe como ninguém, cuidar do que é seu. “Fora daqui quem é exemplo para nós? Canadá, Haiti, São Paulo, Rio? Não tem nenhum país ou estado que é exemplo para nós”, disse, se referindo ao bioma que tem 85% do bioma preservado.
Mas, fez uma cobrança para que invistam na região pantaneira, classificada por ele como a mais pobre do Estado, sem saneamento básico, principalmente, e que é preciso ouvir o pantaneiro antes de se pensar em qualquer lei em relação à região. Ele inclusive aproveitou a oportunidade para convidar os presentes para a Audiência Pública que será realizada pela Prefeitura de Aquidauana nos próximos dias, sobre o mesmo assunto.
SEGUINDO À RISCA
O vice-prefeito de Corumbá, Dirceu Miguéis Pinto, que representou o prefeito Marcelo Iunes (agenda em Brasília), foi taxativo ao afirmar que o pecuarista pantaneiro segue à risca o que determina a legislação, se referindo ao Decreto Estadual 14.272. “Estão aqui há mais de 200 anos e eles são, realmente, quem preserva o nosso Pantanal”, simplificou citando que precisam ser ouvidos sempre que se pensar em legislação específica para o bioma.
O presidente do Sindicato Rural de Corumbá, Gilson Araújo de Barros, disse que houve um retrocesso. Lamentou o fato de o Decreto Estadual não ter se tornado Lei Estadual, e que após oito anos, o assunto voltou à tona, e que “estamos aqui novamente discutindo regras para o desmatamento dentro do Pantanal. Isso traz uma insegurança jurídica muito grande”, citou.
“Ninguém investe em fazenda pensando em oito anos, o retorno é longo e precisa ter uma política que alcance a rentabilidade que a fazenda vai lhe trazer. É um investimento muito alto”, observou. Ele cobrou uma legislação específica, com toda segurança jurídica, para evitar prejuízos a planície pantaneira, que pode gerar desemprego, prejuízos financeiros, sociais e até ao estado, ao município e ao país, mas principalmente à população pantaneira.
Ele é a favor de se ouvir sempre o homem pantaneiro, assim como o presidente do Sistema Famasul, Marcelo Bertoni, que destacou a importância do produtor rural para o bioma onde produz com sustentabilidade e contribui para que mais de 85% da vegetação nativa do bioma estejam preservados.
“Nosso estado tem belezas naturais e tem produtores responsáveis. São 300 anos com o Pantanal preservado até hoje graças ao produtor rural pantaneiro. Mesmo com as autorizações e decretos dizendo que se podia muito mais, o produtor manteve 85% da vegetação nativa intacta”,
Leonardo Pereira Gomes, da ONG SOS Pantanal, que trava uma luta contra o plantio de soja no Pantanal, foi outro que destacou a presença do pantaneiro na preservação da região, ressaltando que já fazem isso há mais de 200 anos. “É o bioma mais conservado do Brasil”, e que sabe inclusive, lidar com fogo, se referindo às recentes ‘batalhas’ contra as queimadas em solo pantaneiro.
MINERAÇÃO E PESCA
Outros assuntos abordados foram relação à mineração e à pesca, que também precisam de um tratamento especial na instituição da Lei do Pantanal, seja ela estadual ou federal. A mineração, por exemplo, é uma atividade forte na região, desenvolvida em uma área de somente 90 hectares, mas que gera 14 mil empregos e, em 2022, arrecadou R$ 46 milhões, com previsão de chegar a 80 milhões em 2023, sem contar o fato de que as mineradoras são obrigadas a cumprir uma legislação pesada.
Em relação ao escoamento da produção, a hidrovia é uma das alternativas viáveis, mas que esbarra no nível das águas do Rio Paraguai (ficou parada durante um bom tempo devido à seca), além do fato de que há necessidade de dragagem em vários pontos do Rio Paraguai que, desde 2019, enfrenta problemas com a saída da Administração Hidroviária do Paraguai (Ahipar) de Corumbá.
Sobre a pesca, um assunto lembrado na audiência, foi a lei municipal que proibiu a captura do Dourado, espécie que estava em extinção, em 2012, por cinco anos, e depois em 2017, por 10 anos, mas que se tornou Lei Estadual somente em 2019. O tema foi levantamento pelo segmento pesqueiro para mostrar que o Pantaneiro sabe como ninguém, cuidar do seu ambiente. Mas, foi cobrada a liberação da pesca em unidades de conservação permanente, onde a atividade é proibida, dentro do Pantanal.
VEREADORES
Os vereadores presentes ao evento, Ubiratan Canhete de Campos Filho (Bira), presidente da Casa de Leis; Samyr Sadeq Ramunieh (Qualhada); Genilson José; Roberto Façanha; Alexandre Vasconcellos; Allex Dellas, e a vereadora Raquel Bryk, destacaram a importância do evento, oportunidade para ouvir os mais diferentes segmentos, importantes para a elaboração de uma lei específica sobre o Pantanal.
A mesa dos trabalhos contou com as presenças dos vereadores Chicão e Bira; prefeitos Fábio Santos Florença (Miranda) e Odilon Ribeiro (Aquidauana); vice-prefeito Dirceu Miguéis; Dácio Queiroz, vice-presidente da Acrisul; José Anibal Comastri, pesquisador da Embrapa Pantanal; Eduardo Pereira, coordenador de mineração da Secretaria de Estado de Meio Ambiente, Desenvolvimento, Ciência, Tecnologia e Inovação; Pedro Mendes Neto, representante do Imasul (Instituto de Meio Ambiente de Mato Grosso do Sul), e Marcelo Bertoni, presidente do Sistema Famasul.